Luciano
Capistrano
Professor:
Escola Estadual Myriam Coeli
Historiador:
SEMURB/Parque da Cidade
Quando
criança, além das brincadeiras de rua, o que me animava era a ida
ao cinema, quanta alegria nos domingos, quando papai e mamãe levavam
eu e meus irmãos para ver a sétima arte. O Rio Grande, o Rex, o
Cine Nordeste e o Panorama, fazem parte de minha memória afetiva,
tempos bons, filmes, brincadeiras, pipocas com guaraná “champanhe”
e, nos dias de “esbanjamento”, tinha torrada com vitamina de
abacate na Casa da Maçã, delicias.
Uma
época de cidade pacifica, andávamos sem preocupação com a
violência, assaltos era coisa rara de acontecer.
Nestes
dias, de crises, ‘carne fraca”, “lava jato”, “golpe”,
violência
sem limite,
dias
de tantas interrogações, aproveitei para reler alguns livros, entre
eles “Écran Natalense”, clássico sobre a história do cinema em
Natal, obra de referência para quem deseja conhecer os caminhos da
história cinematográfica potiguar. Anchieta Fernandes, pesquisador
e participe da cena urbana de Natal, enveredou com outros amantes do
cinema pelos caminhos dos Cine Clube Tirol, “movimento”
importante na difusão entre parte da juventude dos anos de
1950/1960, da Sétima Arte, o pesquisador nos presenteia com uma
excelente publicação, do Sebo Vermelho, sobre este universo da
“telona” na cidade de Natal.
Publicado
em 1992 “Écran Natalense” é leitura obrigatória para quem
deseja conhecer o mundo do cinema em Natal. O Cine Nordeste, por
exemplo, é apresentado por Anchieta Fernandes:
Quase
ao final da década de 50, Natal teve inaugurado seu primeiro cinema
com ar condicionado. O Cine Nordeste, da Cireda. A primeira sessão
para o público foi a 20 de dezembro de 1958, exibindo o filma “O
Príncipe e a Parisiense”, do diretor francês Michel Boisorond.
[...] {lembranças} do tempo em que passava o Cinema de Arte no
Nordeste, e todos íamos conversar nas mesas da Sorveteria Oásis,
tomando algum sorvete ( a preferência era por sorvete de abacate)
antes de começar a sessão. A sorveteria hoje não existe mais, e
seu espaço agora é ocupado pela Farmácia Padre João Maria.
(FERNANDES, Anchieta. Écran Natalense. Natal: Sebo Vermelho, 1992,
p.119-123)
Hoje,
muito em decorrência da violência e da comodidade encontrada nos
shoppings, não temos mais os “cinemas de rua”, as grandes
salas de cinema, do bairro da Cidade Alta ao bairro do Alecrim,
desapareceram. A geração atual, chega a ficar “espantada” ,
quado dizemos, “sim, o Alecrim tinha cinema”:
Se
indagássemos aos jovens do século XXI sobre cinemas em Natal,
muitos falariam das salas cinematográficas que existem nos shopping
centers da capital. A maioria não se recorda das salas de cinema do
Rex, Rio Grande, Nordeste, Panorama e Rio Verde, famosas nas décadas
de 1970, 1980 e primórdios da década de 1990, nem daquelas
localizadas na Cidade Alta, Rocas ou Petrópolis. Mas era no bairro
do Alecrim onde se concentrava o maior número de salas de cinema da
cidade entre as décadas de 1920 e 1950, frequentadas em sua
juventude por avós, tios e pais.( ALVEAL, Carmen M. O. etal .
Memória minha comunidade: Alecrim. Natal: SEMURB, 2011, p.114)
De
cinemas e memórias: divagações, como uma colcha de retalhos, feita
por minha avó Paulina, vou caminhando na estrada de Clio, buscando
compreender a urbe e suas resignificações ao longo do tempo. A
cidade traz na sua essência a transformação da paisagem, os
lugares ganham em tempos outros, funções diferentes e assim, entre
o antigo e o novo, me encontro, neste tempo presente a olhar o
passado.
Ao
fazer este percurso sobre o “asfalto” do passado, sigo as
palavras do Historiador Jacques Le Goff: “A memória, na qual
cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura salvar o
passado para servir ao presente e ao futuro. Devemos trabalhar de
forma que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a
servidão dos homens”. (GOFF, Jacques Le. História e memória.
Campinas: Editora Unicamp, p.471)
Enfim
a cidade cresceu - os cinemas de ruas, encontraram abrigos nos
shopping centers, as conversas de calçadas, na “boca da noite”,
são momentos raros, as ruas viraram espaços temerários -, as
incertezas, neste caldeirão dos tempos presentes, é o que temos de
mais promissor. Nos resta escrever e provocar o dialogo sobre os
caminhos e descaminhos da urbe.
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