quarta-feira, 14 de março de 2018

13 de março de 1964, um discurso, muitas reflexões


13 de março de 1964, um discurso, muitas reflexões
Luciano Capistrano
Professor: Escola Estadual Myriam Coeli
Historiador: Semurb/ Parque da Cidade Dom Nivaldo Monte

No Japão de pós-guerra, há quase 20 anos, ainda ocupado pelas forças aliadas vitoriosas, sob o patrocínio do comando vencedor, foram distribuídos dois milhões e meio de hectares das melhores terras do país, com indenizações pagas em bônus com 24 anos de prazo, juros de 3,65% ao ano. E quem é que se lembrou de chamar o General MacArthur de subversivo ou extremista?
Nações capitalistas, nações socialistas, nações do Ocidente, ou do Oriente, chegaram à conclusão de que não é possível progredir e conviver com o latifúndio.
A reforma agrária não é capricho de um governo ou programa de um partido. É produto da inadiável necessidade de todos os povos do mundo. Aqui no Brasil, constitui a legenda mais viva da reivindicação do nosso povo, sobretudo daqueles que lutaram no campo.
A reforma agrária é também uma imposição progressista do mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para sobreviver. ” (Trecho do discurso de João Goulart no dia 13 de março de 1964 na Central do Brasil – Acessado em http://www.ebc.com.br/cidadania/2014/03/discurso-de-jango-na-central-do-brasil-em-1964)
           O comício da Central do Brasil, é apontado por diversos historiadores como sendo a gota d’água na fervura vivida pela sociedade brasileira, nos tumultuados dias anteriores ao golpe civil-militar de abril de 1964. As forças conspiradoras, encamparam o discurso acusador de Jango “comunista”.
         O Presidente João Goulart (Jango), político “cria” do antigo PTB, Partido Trabalhista Brasileiro, expoente da linhagem nacional desenvolvimentista, não era aceito por setores militares e civis, capitaneados por interesses estrangeiros, notadamente, articulados a partir da embaixada norte-americana, chefiada no Brasil, a época, por Lincoln Gordon:
Obviamente não podia imaginar que aquilo fosse acabar em regime de exceção prolongado. Se alguém me sugerisse naquele dia que o governo militar iria durar 21 anos, eu diria que o sujeito era louco. A famosa operação Brother Sam, que se atribui à CIA, foi na verdade uma operação da marinha de guerra orquestrada por mim (GORDON apud COUTO, 1999, p.57).
          Fica claro no depoimento do ex embaixador Lincoln Gordon, a participação direta dos EUA, na derrubada do governo de Jango e instalação em solo brasileiro de um regime ditatorial comandado pelos militares associados aos interesses externos com apoio de grupos políticos internos, para cita apenas algumas das lideranças civis, apoiadores do golpe de 1964, Carlos Lacerda, Magalhães Pinto, Aluízio Alves,e, outros governadores e parlamentares, alguns destes foram cassados pelos próprios militares.
         Ao me reportar aos tristes acontecimentos da década de 1960, o faço, de certo modo, movido pelos discursos, as vezes “ingênuos”, as vezes “convictos”, defendendo a “intervenção militar”, como forma de retirar o Brasil da crise política vivida nos tempos presentes. Ora, a historiografia, extensa, já comprovou o equívoco que foi a ação “dantesca” que levou ao golpe civil-militar de 1964, isso, é um ponto passivo. Agora, se existem quem levante a bandeira da intervenção militar, cabe, sim, uma reflexão sobre os fatos passados, assim, penso ser importante travar o bom diálogo diante da atual conjuntura.
          Algo me faz pensar sobre os caminhos que levaram a democracia brasileira a cair no “poço sem fim” da ditadura civil militar-1964, é o discurso, transvestido de democrata, que acusava Jango de comunista. Em seu discurso, na Central do Brasil, naquele 13 de março, o Presidente Jango, fez acertadamente uma referência as medidas adotadas, no Japão do pós Segunda Guerra pelo General MacArthur, sobre a distribuição de terras naquele país do pacífico. O general norte-americano, em nenhum momento foi acusado de comunista por defender uma distribuição de terras. Faço, essa referência, para dizer do risco que existe no discurso, dito por muitos “analistas das redes sociais”, inquisidor apontando como comunistas qualquer atitude, mesmo, a simples referência a “democracia” como único caminho para sairmos da crise politica brasileira.
         Vivemos, guardadas as devidas diferenças, uma conjuntura muito próxima da vivida na década de 1960. Quando propor reformas dentro do sistema capitalista era tido como ato subversivo.
         O golpe civil-militar de 1964, não foi a solução para a “crise”, o comício da Central do Brasil, do dia 13 de março de 1964, não foi o culpado pela queda do governos eleito democraticamente, do Presidente João Goulart. O acontecimento do dia 13 de março, foi apenas uma gota, um pretexto, par ao golpe que estava em curso, sobre as diretrizes da embaixada norte-americana. Resultado, vivemos os priores tempos de torturas e violações de direitos universais.
Houve muita violência após o golpe de 1º de abril, ao contrário do que sustentam alguns analistas que insistem em caracterizar a derrubada de Goulart como uma ação incruenta. […] em Recife, o velho líder comunista Gregório Bezerra teve seu cabelo arrancado com alicate, seus pés molhados com ácido e seu pescoço amarrado com cordas. Bezerra foi arrastado pelas ruas e seus algozes conclamavam a população – que assistia aterrorizada – a execrá-lo.(FICO, p. 55-56, 2015).

          Finalizo, este curto artigo, reafirmando a disposição para o diálogo fraterno sobre os fatos de nossa história.
Referencias 
COUTO, Ronaldo Costa. História indiscreta da ditadura e da abertura: Brasil (1964-1985). Rio de Janeiro: Record, 1999.
FICO, Carlos. História do Brasil contemporâneo: da morte de Vargas aos dias atuais. São Paulo: Contexto, 2015.



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