Livros, sebos, editores: apenas divagações,
enquanto a noite não vem!
Luciano Capistrano
Historiador: Parque da Cidade Dom Nivaldo Monte
Professor: Escola Estadual Myriam Coeli
Em minhas andanças por ruas e becos de nossa linda "Baby", como diz os belos versos de Pedrinho Mendes, gosto de ir aos sebos, não canso de falar sobre estes lugares mágicos, onde livros, gentes, transpiram inquietações humanas. Lugar de encontros, além dos ácaros, saberes empoeirados, num canto da estante ou numa pilha fora da ordem, das vitrines shopping-centers, acha-se os mais variados tipos de conteúdos, tem de tudo.
O bom é o achado, cata livros, literalmente, não me anima o "catalogo", estante "A", estante "B" e assim por diante, não, gosto do que minha mãe diria: Que bagunça é essa menino! Sim, o sebo guarda este sabor da procura.
Foi em dezembro, acho que de 2015, que encontrei "Cantigas de amigo", obra de Myriam Coeli, quando caminhava, em um domingo de sol, pelo bairro da Cidade Alta, eu e dois grandes amigos, professores de história, Henrique Lampreia e Otoniel Miranda. Existe quase uma tradição de nos encontramos no último mês do ano e visitarmos os "pontos históricos", saímos, diria, em um passeio dialogado sobre memórias, histórias e políticas de preservação do patrimônio material e imaterial da cidade de Natal, na verdade, estes encontros são uma espécie de energização para enfrentarmos os desafios do ano vindouro.
Bem, amigo velho, encontrei a poesia de Myriam Coeli, no Sebo Vermelho, uma edição da "CLIMA", Cantigas de amigo, vencedora do prêmio Otoniel de Menezes de 1980. Aqui, me permitam, começo a dar o rumo a essa prosa, este curto escrito tem como objetivo primeiro ressaltar a importância da CLIMA para nossa produção literária. Capitaneada por Carlos Lima, foi responsável pela publicação de grandes expressões das letras potiguares. Lembro da Livraria Clima, lá na Ribeira, rua dr Barata, eu um jovem comerciário, trabalhador da Livraria Universitária, gostava de passar as horas de folga naquele templo das letras, onde encontrei o mestre Deífilo Gurgel, e o seu, Os dias e as noites, mas, foi no sebo, onde achei Rubens Lemos, com seus versos, abrindo as edições da Clima: Ciclos da Pedra e do cão. É, a Carlos Lima, todas honras de quem iniciou a aventura por entre autores norteriograndenses, graças a sua ousadia em publicar a escrita local.
A noite
e uma chuva
se intimizam
intimidando
homens ocultos
nos olhos
necessariamente
abertos
Há um alerta
em todo os sentidos.
Em todos os latidos
há zelosos cães.
- E uma pedra não há
para enfrenta-los?
(Rubens Lemos – Ciclos da pedra e do cão)
Os Fantoches
O fantoche obedece cegamente
ao comando do manipulador:
um tempo de sorrir e estar contente,
um tempo de chorar e sentir dor.
Mas, a face não muda. A gente sente
olhando em seu olhar, seja o que for
de morte e solidão, a inconsistente
vida a que uma outra vida dá calor.
O homem dos fantoches é sucesso:
- Distinto público, eu agora peço...
(Silencia a ululante patuléia).
A lágrima e o sorriso controlados
nos cordéis habilmente disfarçados.
(Os fantoches no palco ou na plateia?).
(Deífilo Gurgel – Os dias e as noites)
Tempo que se refaz,
Gera palavra e invento,
Se a vós devolve a paz,
A mim, ânsia e tormento.
Enganos me sustentam
E tecem argumentos;
Se intentos acalentam
Desvivem meus momentos.
(Myriam Coeli – Cantigas de amigo)
A cidade da Câmara Cascudo, onde cresceu os versos modernistas de Jorge Fernandes, ainda tem de fazer conhecido os seus editores, homens como Carlos Lima, um pouco mais atrás, Fortunato Aranha, o livreiro da Livraria Cosmopolita, editou da primeira edição da História da Cidade do Natal, e, o hoje, Abimael Silva, o capitão do Sebo Vermelho, responsável por descobrir novos escritores e reeditar obras raras, estes homens muito mais do que comerciantes, se propuseram a enfrentar os "moinhos de ventos", como Dom Quixote, ousaram editar as letras potiguares. Tenho um desejo, já iniciado, de concluir uma pesquisa sobre os editores das letras potiguares. Bem, enquanto não realizo meu sonho, fico à cata livros, nos empoeirados, mas sempre prazerosos, sebos de nossa cidade de Natal. Enfim, deixemos os versos de Rubens Lemos, Deífilo Gurgel e Myriam Coeli, nos embalar neste mar das modernidades tão estranho: feio e belo ao mesmo tempo.
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