domingo, 23 de setembro de 2018

Viva a Literatura de Cordel: Patrimônio Cultural do Brasil

Viva a Literatura de Cordel:
Patrimônio Cultural do Brasil
Luciano Capistrano
Professor e Historiador




“Eis a real descrição
Da história da donzela
Dos sábios que ela venceu
E a aposta ganha por ela
Tirado tudo direito
Da história grande dela”.
(História da donzela Teodora - Leandro Gomes de Barros)

No dia 13 de setembro de 2018, a Literatura de Cordel é reconhecida como Patrimônio Cultural do Brasil. Importante ato, pois o Cordel tem a muito tempo uma grande referência na cultura do brasileiro. O dia 13, me fez lembrar de um velho amigo, o senhor Macilon, eu ainda jovem, ainda sem a calvície e os poucos cabelos brancos de hoje, o conheci quando morava no conjunto habitacional Santa Catarina e me fiz de comerciante, tempo em que me aventurei no mundo empresarial das livrarias e papelarias. Pois bem, seu Macilon, todo final de tarde vinha me visitar, na avenida Blumenau, onde localizava-se meu estabelecimento comercial, na verdade uma pequena loja.
O fato é que todo final de tarde, sentados no batente da porta da loja eu e seu Macilon conversávamos sobre a vida e as memórias vividas por aquele senhor, na época eu me achava tão jovem, bem o tempo passa. Em nossas conversas o cordel sempre esteve presente, e, particularmente a História da Donzela Teodora.
Quando vi a notícia do reconhecimento do Cordel como Patrimônio Cultural do Brasil, me lembrei logo de meu velho companheiro das tardes do Santa Catarina.
Como era gratificante ir aos sábados na feira do conjunto Santa Catarina e procurar cordéis para alimentar minhas conversas com seu Macilon, brincávamos com o fato, dele ser o Macilon do bando de Lampião. Reminiscências de lado, vejamos o mote deste, curto, artigo. A  Literatura de Cordel: Patrimônio Cultural do Brasil.
A Literatura de Cordel tem o reconhecimento merecido, por muito tempo já aclamado como Patrimônio do povo brasileiro, agora recebe o reconhecimento oficial. Leandro Gomes de Barros, considerado o pai do cordel, deve está comandando lá no céu a celebração da poesia sertaneja. Uma literatura, tão fundamental quanto a dita erudita. Neste quesito me filio ao campo dos estudiosos da cultura que não fazem distinção entre, popular e erudito, poesia é poesia e ponto. Como nos ensina o poeta e pesquisador Aderaldo Luciano:

Vamos abrir um parêntese para divertir que aqui não desejamos fazer distinção entre o que se denomina literatura popular e o que se determina literatura erudita. Para nós existirá Literatura. Não haverá, pois, para nós, poesia popular, a cuja abrangência reservou-se vincular o cordel. Essa distinção, segundo percebemos, reside na forma preconceituosa e excludente com que as elites intelectuais sempre trataram as produções que não saíssem de suas lides ou que não seguissem os seus ditames. Popular seria aquela poesia produzida pelo “povo”, os não letrados, os trabalhadores rurais, os habitantes dos guetos. Erudita seria aquela produzida pela elite intelectual, frequentadora da escola e detentora do poder econômico.(ADERALDO, Luciano. Apontamentos para uma História Crítica do Cordel Brasileiro. São Paulo: Editora Luzeiro, p. 17, 2012).

É neste sentido que penso a literatura de cordel, como uma forma de expressão nascida entre as camadas mais populares, agora sem o ranço, ainda presente entre alguns segmentos, de uma literatura “menor”. Não a distinção das formas de poesias, não se justifica a divisão: erudita e popular, principalmente quando acompanhado do viés preconceituoso.  A poética cordelista, tem uma vastidão temática, como acentua o pesquisador Irani Medeiros:

O cordel usa tudo, ou quase tudo. como motivo para criação dos folhetos dos poetas populares. Desde os romances tradicionais - Carlos Magno e os Doze Pares de França, a Imperatriz Porcina, João de Calais, etc -, que nos chegaram da Idade Média, através do romanceiro ibérico, sendo aqui readaptado à ecologia e aos sentimentos nordestinos, até assuntos históricos brasileiros, fatos ligados à religiosidade, ao misticismo, à vida campestre, crimes, acontecimentos mais recentes da atualidade universal[...] (MEDEIROS, Irani. Leandro Gomes de Barros: no reino da poesia sertaneja. João Pessoa: Editora Idéia, 2002, p.13)
Nos tempos do “Cantinho do Poeta”, do saudoso cordelista Zé Saldanha, o dia 13 de setembro teria sido saudado com muita alegria. Ao lado de Bob Mota, Zé Saldanha deve ter feito, lá no céu, versos celebrando a Literatura de Cordel: Patrimônio Cultural do Brasil.
Enfim, finalizo, agradecendo aos resistententes cordelistas, em nossa cidade representados na Casa do Cordel e na Estação do Cordel, lugares vivos, localizados no bairro Cidade Alta.

terça-feira, 4 de setembro de 2018

A memória virou cinza!

02 de setembro de 2018: a memória virou cinza!
Luciano Capistrano
Professor e Historiador

Museu Nacional

Vestígios
Da humanidade
Em minutos
Cinzas... nada mais.
(Luciano Capistrano)


A noite de domingo, dia 02 de setembro, ficará marcada como o nosso “trágico setembro”. Perdemos, a sociedade brasileira perdeu, confesso, não resisti, fui às lágrimas ao ver o Museu Nacional em chamas. Imagem do terror, um terror a muito anunciado, pois, há anos, as Instituições Científicas e de Ensino, sofrem o descaso, de gestões públicas indiferentes a produção do conhecimento.
As chamas, consumiram em poucas horas anos e anos de pesquisas, de estudos, do acervo repleto de raridades, nos diversos campos do conhecimento. Em junho, passado, o Museu Nacional, completou 200 anos de existência, em sua trajetória seu acervo foi enriquecido, chegando a um número grandioso: 20 milhões de itens, fazendo do seu acervo um dos mais importantes do mundo.
Luzia, fóssil mais antigo da América, encontrado no Brasil, uma mulher de mais de 11.000 anos, não resistiu aos desmanches ou a não existência de políticas públicas preservacionistas de nossa memória. Nossas casas de memórias, estão em risco.
O fogo transformou em cinzas raridades,como por exemplos, pergaminho datado do século XI com manuscritos em grego sobre os quatro Evangelhos; a Bíblia de Mogúncia, de 1462, primeira obra impressa a conter informações como data, lugar de impressão; a crônica de Nuremberg, de 1493, considerado o livro mais ilustrado do século XV, com mapas xilogravados tidos como os mais antigos impressos em livro, estes são apenas uns dos milhões de documentos perdidos.
Criado por Dom João VI, ocupando um belíssimo prédio histórico, o Palácio São Cristóvão, na Quinta da Boa Vista, residência real, desde a chegada da família imperial portuguesa, em 1808, foi a partir de 1892 instalado o museu.
Na semana da pátria, quando a sociedade brasileira celebra a Independência, somos tomados pelo sentimento de perda, no que existe de mais simbólico, quando pensamos em uma identidade nacional, nossa memória se esvaiu nas chamas da irresponsabilidade de gestores malfeitores da coisa pública.
Nossa cidade Natal, como o Brasil, carece de uma política de valorização dos arquivos e museus, como espaços guardiões de nossa memória. Nestes lugares, apesar da boa vontade dos seus funcionários, falta infraestrutura e equipamentos adequados para a conservação do acervo.
Um exemplo, bem ilustrativo, da situação destes lugares de memória, são o arquivo Público Estadual e o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. Volto a repetir, meu caro leitor, nossos arquivos contam com profissionais comprometidos na preservação da documentação pertencentes aos seus acervos.   
Acervos em situação de risco. Coleções de jornais, manuscritos, fotografias, livros de óbitos, diversos tipos de documentos, enfim, encadernados, mas impossibilitados de serem consultados, pois, o estado em que se encontram correm riscos de abertos, se desmancharem, virarem pó.
Urgente faz necessário, desenvolver políticas públicas referentes a preservação dos acervos guardados nestes lugares de memória. Os arquivos públicos ou particulares e museus, não podem serem tratados como, “lugar de mortos”, e sim “lugar de vivos”. Espaços em que encontramos o pulsar das gerações passadas, fazedores do amanhã. Aos órgãos de preservação da memória nacional, resta efetivar uma política de salvaguardar os acervos deixados por nossos antepassados. Uma política que contemple dois vieses: a organização dos arquivos e museus e o desenvolvimento de Educação Patrimonial. Deste modo, o indicativo infraestrutura e educação caminhando de mãos dadas na guarda dos “tesouros da história”.
O Patrimônio Histórico/Cultural, necessita de proteção, e, não basta apenas uma legislação faz necessário uma ação de Estado, uma Política Pública de gestão deste Patrimônio. 02 de setembro de 2018: a memória virou cinza!


Foto: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte - Luciano Capistrano

A esperança se vestiu de cinza.

  A esperança se vestiu de cinza.               Aqui faço um recorte de algumas leituras que de alguma forma dialogam sobre os efeitos noc...