quinta-feira, 28 de maio de 2020

Abraham Weintraub, porque não Te calas?

Abraham Weintraub, porque não Te calas?

Luciano Capistrano

Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli

Mestrando: Profhistória/UFRN

             No dia 27 de maio o Ministro do STF (Superior de Tribunal de Justiça) Alexandre de Moraes, ordenou a PF (Policia Federal) uma ação de busca e apreensão em endereços de empresários e deputados aliados do Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro. Na operação a PF apreendeu celulares e computadores dos alvos da investigação. Os policiais cumpriram decisão judicial decorrente do inquérito do STF que investiga o “gabinete do ódio”, propagador de fake News no Brasil.

            A surpresa, se é que podemos chamar de surpresa, foi a publicação do Ministro da Educação, do governo Bolsonaro, Abraham Weintraub, em sua conta do Twuitter chamando a operação da PF de “Noite dos Cristais Brasileira”. Bem, não é apenas um erro jurídico ou histórico, me parece algo intencional. O ministro da Educação já tem um histórico de opiniões descabidas de fundamentação historiográfica e cheias de viés fascistas. Vamos aos fatos.

            A Noite dos Cristais uma ação empreendida por paramilitares e grupos de apoiadores do Partido Nazista Alemão contra a comunidade judaica, uma triste noite se abateu sobre a humanidade. A noite de 9-10 de novembro de 1938 como beneplácito das autoridades alemães silenciaram diante das ações de ódio praticadas por militantes seguidores de Hitler. Noite dos Cristais porque milhares de cacos de vidros se espalharam por ruas depois do ataque, ensandecido, contra lojas, edifícios e sinagogas em uma das ações mais nítidas na previa da escalada nazifascista em curso na Alemanha sobre a liderança do Partido Nazista.   Fazer uma alusão a este fato em relação a uma operação policial originaria em um processo legal conforme os ditames da Constituição é uma afronta a memória dos milhões de judeus e outras minorias perseguidas pelos carrascos nazistas.

            A Comunidade Judaica brasileira emitiu uma nota de repúdio a declaração do Ministro da Educação. Vejamos a nota do CONIB (Confederação Israelita do Brasil:

 “Não há comparação possível entre a Noite dos Cristais, perpetrada pelos nazistas em 1938, e as ações decorrentes de decisão judicial no inquérito do STF, que investiga fake news no Brasil. A Noite dos Cristais, realizada por forças paramilitares nazistas e seus simpatizantes, resultou na morte de centenas de judeus inocentes, na destruição de mais de 250 sinagogas, na depredação de milhares de estabelecimentos comerciais judaicos e no encarceramento e deportação a campos de concentração. As ações do inquérito, por sua vez, se dão dentro do ordenamento jurídico, assegurado o direito de defesa, ao qual as vítimas do nazismo não tinham acesso. A comparação feita pelo ministro Abraham Weintraub é, portanto, totalmente descabida e inoportuna, minimizando de forma inaceitável aqueles terríveis acontecimentos, início da marcha nazista que culminou na morte de 6 milhões de judeus, além de outras minorias.” (https://www.conib.org.br/conib-condena-comparacao-de-inquerito-do-stf-a-noite-dos-cristais/ - Acessado em 28/05/2020) .

             A liberdade de expressão não pressupõe a livre propagação de falsas verdades ou de discursos de ódio. A fala do Ministro da Educação sobre os povos originários, indígenas, na reunião do Conselho Ministerial do dia 22 de abrial e sua postagem na noite do dia 27 de maio, fazendo uma comparação entre a “Noite dos Cristais” e a operação realizada pela PF em uma investigação realizada as clara, sob o manto da Constituição, tem de ser repudiada por toda a sociedade brasileira.

            Abraham Weintraub, porque não Te calas?


quarta-feira, 27 de maio de 2020

Dia 27/05, dia Nacional da Mata Atlântica: A Constituição é a Porteira

Dia 27/05, dia Nacional da Mata Atlântica: A Constituição é a Porteira.

Luciano Capistrano

Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli

Mestrando: Profhistória/UFRN

Caos

 

Tempos modernos,

progresso sem limites,

chaminés expelem fumaças,

ares poluídos, reflexos,

cinzas descolorem o céu,

rios, mares, lagos,

águas potáveis findas,

espécies extintas,

natureza finita,

tempo indefinido,

altas temperaturas,

baixas temperaturas,

confusão climática,

geadas, secas, chuvas,

estações indefinidas

tempos loucos,

humanidade finita,

caos ambiental,

Terra, lar em perigo.

(Luciano Capistrano)

 

            Passar uma boiada, pisar sobre os vestígios da mata atlântica, este parece claramente ser o objetivo do Ministro do Meio Ambiente do governo Bolsonaro, conforme sua fala na reunião do Conselho Ministerial, ocorrida no dia 22 de abril do corrente ano. Disse o Ministro em certo momento da citada reunião, tornada pública por força de decisão do STF (Superior Tribunal Federal):

“Então para isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos neste momento de tranquilidade no aspecto de cobertura da imprensa, porque só fala de Covid e ir passando a boiada mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN, de Ministério da Agricultura, de Ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo”, disse Salles durante o referido encontro. Entre uma fala e outro o Ministro do Meio Ambiente usou a expressão, "ir passando a boiada", conforme sua fala aproveitando o momento atual de pandemia onde os meios de comunicação estão preocupados com o agravamento do coronavírus.

            A Mata Atlântica foi o cenário de chegada dos primeiros europeus em terras do futuro Brasil. Desde os tempos da colonização o desenvolvimento e o meio ambiente foi, digamos palco de disputa, como manter a locomotiva do progresso em funcionamento e a preservação ambiental? Essa tem sido a questão posta para o mundo contemporâneo:

 A partir do momento em que a criação de áreas protegidas influencia o Ordenamento Territorial gera processos. Esse ordenamento, porém, é essencial na busca de desenvolvimento com justiça social e conservação ambiental. Só o planejamento e a gestão do território pelo Estado são capazes de promover desenvolvimento com distribuição de riquezas, associado à conservação ambiental, sobretudo com foco na biodiversidade, que requer política estratégica de longo prazo. (GESTÃO da biodiversidade e áreas protegidas In. GUERRA, Antônio José Teixeira; COELHO, Maria Célia Nunes (Org.) Unidades de conservação: abordagens e características geográficas. São Cristóvão: Editora Bertrand Brasil, 2009, p.48)

             Ao refletir sobre nossa formação territorial não podemos deixar de pensar sobre os recursos naturais e neste sentido a Mata Atlântica tem papel fundamental na preservação dos nossos mananciais e claro com todo o significado para a biodiversidade, fauna, flora, enfim para a vida. Progresso com sustentabilidade deve ser o mote a ser seguido, não existe outra solução para a nossa existência. Os Parques Ambientais, as Unidades de Conservação são fundamentais nestes processos de preservação dos recursos naturais, daí a importância de termos todo o cuidado ao ouvir falas como a do Ministro Salles: "...ir passando a boiada...".

            Um exemplo que gosto de lembrar é a luta travada entre “desenvolvimentistas” e “ambientalistas” quando do projeto da Via Costeira na Cidade do Natal. Uma acirrada disputa que resultou na construção de uma linda avenida beira-mar com uma rede de hotéis e um dos maiores Parques Urbanos do Brasil o Parque das Dunas. Assim:

Dentro da Capital do Sol, temos como destaque a reserva do Parque das Dunas, que apresenta árvores de grande porte, espécies como jatobá, maçaranduba, sapucaia, ubaia-doce, jurema-branca, sucupira-mirim, pau-ferro, pau-d’arco roxo, pau-d’arco amarelo, cajueiro e angelim entre outras. Abriga uma diversidade de aves, mamíferos e insetos. (NATAL ambiental. Natal: SEMURB, 2009, p.08).

             Finalizo com a Constituição Brasileira e sua proteção ao meio ambiente. A Constituição seja a porteira para impedir a “boiada” do Ministro Salles:

 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

     § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

         I -  preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

         II -  preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

         III -  definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

         IV -  exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

         V -  controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

         VI -  promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

         VII -  proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.



   Visão parcial do Bairro Mãe Luíza - Parque das Dunas.

domingo, 3 de maio de 2020

Covid 19: Estamos todos no mesmo barco?


Covid 19: Estamos todos no mesmo barco?
Luciano Capistrano
Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli
Mestrando: Profhistória/UFRN

            “Tem uma coisa sobre a Covid 19: Ele não liga se você é rico ou pobre, quanto famoso você é”. (Madona)

            Essa afirmação de Madona tem verdades contraditórias, digamos, com a nossa realidade e a de muitos outros países. Em algumas nações o nível de enfrentamento da pandemia ocorre em certo grau de igualdade, mas essa situação não é comum a maioria das nações. Por que me refiro a contradições? Uma vez enfermo com este novo coronavírus, independente das condições socioeconômicas necessitaremos dos mesmos cuidados? Não estaremos igualmente correndo os mesmos riscos? Aparentemente sim. Agora o que pretendo trazer ao diálogo são o incomodo que me causa ao ouvir essas afirmações que estamos no mesmo barco.
            Uma das questões em evidencia diz respeito as politicas de prevenção orientadas pelos diversos organismos de saúde pública, como a OMS (Organização Mundial de Saúde) e o Ministério da Saúde, o Isolamento Social e o Distanciamento Social. A Quarentena é vivenciada em igualdade por todos nós? Estamos todos no mesmo “barco”, nessa crise, da Covid 19.
            Diante das questões façamos um percurso, mesmo rápido, sobre aspectos da urbanização de Natal na busca de compreender a relação da formação territorial da urbe e as possíveis respostas sobre se estamos todos no mesmo “barco” nessa crise da Covid 19.
            Uma das realidades postas dizem respeito ao traçado urbano, me refiro a cidade de Natal, como apontou o Professor Pedro de Lima, desde o Plano Polidrelli (1901-1904) a urbanização se pautou nas vias abertas naquele grande “loteamento”. Conhecido como Plano da Cidade Nova, origem do terceiro bairro da cidade, hoje Tirol e Petrópolis, consolidava o viés da segregação espacial das classes sociais. Assim:

A Cidade Nova se constituiu em uma dupla solução para o desejo de autossegregação das classes dominantes locais. Por outro lado, o Plano Polidrelli superaria o antigo desenho originário da cidade colonial, onde as classes conviviam, praticamente, no mesmo espaço ou guardando uma certa contiguidade. Por outro lado, serviria como refúgio, onde as classes dominantes poderiam se proteger do contato com as péssimas condições ambientais e das epidemias que então, grassavam a cidade. (LIMA, Pedro de. Natal século XX: do urbanismo ao planejamento urbano. Natal: EDUFRN, 2001, P.35)

            Ocorreu então um processo de feitura de uma cidade da exclusão, a  princípio pode parecer muito pretencioso essa definição, mas corrobora com essa perspectiva as criticas do Jornalista Elias Souto, opositor a oligarquia chefiada por Pedro Velho, foi contundente ao se referir ao terceiro bairro que nascia, a Cidade Nova, de Cidade das Lágrimas. Denunciava em seu pasquim as desapropriações e expulsam das famílias pobres das terras loteadas para receber a elite republicana em seu novo habitat.
            Essa marca da exclusão ou dos lugares sem infraestruturas para as camadas mais pobres é um dos principais problemas das políticas urbanas a se arrastarem anos a anos, administrações a administrações municipais. Uma olhada sobre as regiões administrativas de Natal e já percebemos essas diferenças. Podemos dizer que existem diversas cidades em uma. Como no romance da escritora Thrity Umrigar, A Distância Entre Nós:

Bhima termina seu trabalho e dirige-se a torneira. Suspira ao ver a longa fila serpenteando para além dos barracos negros de aparência desordenada, com seus telhados de zinco remendados.  A luz matinal torna a miséria da favela ainda mais visível. Os esgotos a céu aberto com seu cheiro desagradável e pungente, as escuras fileiras de barracos oblíquos [...[.(UMRIGAR, Thrity. A distância entre nós. São Paulo: Edição Folha de São Paulo, 2005, p.14).

            Existe uma cidade real composta de distâncias socioeconômicas desnudas principalmente nos dias atuais. Para grande parcela da população de Natal não é fácil seguir as orientações das autoridades com relação ao isolamento social. E, aqui faço uma provocação: Não estamos no mesmo barco, a pandemia da Covid 19 escancarou a cruel realidade social. Como falar em “Isolamento Social” ou “Distanciamento Social” em uma comunidade cortada por vielas e becos estreitos, casebres de um ou dois cômodos onde moram mais de 4 pessoas, entre crianças, adultos e idosos? Como falar em “Isolamento Social” ou “Distanciamento Social” para uma população de rua?
            São muitos os desafios diante de uma sociedade marcada pela distância socioeconômica.
            Ao aproximar do fim lembro das pesquisas que apontam uma curva em crescimento dos casos da Covid 19 nos bairros mais afastados das aéreas nobres, a um deslocamento dos índices de contágios. No início dos primeiros registros, a concentração das notificações corria nos bairros nobres, Triol e Petrópolis, nos últimos dias o epicentro apresenta um movimento para o bairro Potengi, conforme os dados do dia 30/04.
            Duas questões para nos provocar reflexões sobre os motivos desse deslocamento do epicentro da Covid 19 dos bairros nobres para a periferia de Natal, o problema da habitação e o subemprego, o contagio caminha na rota dos “invisíveis” da sociedade. Onde estão as políticas públicas? Onde estão os programas de renda mínimas? Neste momento fariam a diferença. Existe um divida histórica que precisa ser paga. Pois, ainda ouvimos as vozes dos sem tetos, dos invisíveis, dos excluídos a dizerem: NÃO ESTAMOS NO MESMO BARCO. A cidade do Natal de 2020 ainda convive com uma Natal de 1960, assim nos informa o historiador Wesley Garcia obre as mães sem tetos:

O destino das mães era semelhante ao daqueles que à noite, em frente ao então mercado da Cidade Alta, quando as lojas fechavam e o trânsito de veículos e pedestres ficava quase extinto, começavam a chegar, muitos dos quais balaeiros do mercado, para dormirem nos batentes da lojas fronteiriças, cobertos muitas vezes apenas com um jornal. [..] Assim, o problema da falta de trabalho, da mendicância e da falta de habitação se constituía como desafio para os poderes públicos da década de 1960. Na Cidade do Natal. (SILVA, Wesley Garcia Ribeiro da. Cartografia dos tempos urbanos: Representações, cultura e poder na Cidade do Natal (década de 1960). Natal: EDUFRN, 2011, p. 118).

            Finalizo com a provocação inicial: Covid 19: Estamos todos no mesmo barco?



A esperança se vestiu de cinza.

  A esperança se vestiu de cinza.               Aqui faço um recorte de algumas leituras que de alguma forma dialogam sobre os efeitos noc...