O homicídio tem cor
Luciano Capistrano
Professor e Historiador
"O
réu não possui o estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos
claros, não estando sujeito a ser facilmente confundido". (Juíza Lissandra
Reis Ceccon)
A narrativa de uma democracia racial é muito frágil,
quando nos deparamos com o cotidiano da sociedade brasileira, a realidade é
outra, ainda guardamos “estereótipos” construídos ao longo do tempo, frutos de
uma sociedade erguida nas dores da “diáspora negra”. Aqui, no Brasil, usando as
palavras de Darcy Ribeiro, o português, colonizador, “criou uma engrenagem de
moer gente”. Sentença certeira, o autor do “Povo Brasileiro”, foi muito preciso
nessa sua afirmação, e, hoje constatamos o grande desafio, ainda posto, diante
da sociedade brasileira, de varrer de uma vez por todas, as práticas
preconceituosas, tão, infelizmente, arraigada em nosso país.
A juíza Lissandra Reis, ao proferir em sua sentença a
crença em “estereótipos” de criminosos, juntou-se, infelizmente, a tantas
outras vozes que teimam em manter a narrativa da exclusão racial, lembrando as
velhas teorias do médico/psiquiatra Cesare Lombroso, e das teorias eugênicas,
tão nefastas para a sociedade humana, pois, propõem a superioridade das “raças”.
Este tipo de visão, sabemos onde nos levou, aos “crematórios” nazistas.
A sociedade brasileira tem de dizer em alto e bom tom:
racistas, não passarão!
Não, não é natural um gerente de um banco, a Caixa Econômica,
diante de um homem, negro, dizer: “... não negociaria com esse
tipo de gente...". O empresário Crispim Terral, foi humilhado, pelo único fato
de se dirigir ao gerente e reclamar da demora, foram 4 horas esperando ser
atendido, para completar o drama vivido, a sua filha de 15 anos o acompanhava neste
infortúnio, inclusive presenciou o momento em que os policiais, acionados pelo
gerente do banco imobilizaram Crispim
com um ‘mata-leão”.
Ao olhar o Mapa da Violência, os dados nos inquieta, em
2016, por exemplo, a taxa de homicídios de negros foi duas vezes e meia
superior à de não negros. Uma constatação provocadora, quando relacionada aos
casos de preconceitos, como os descritos acima, meu caro leitor/leitora, não me
resta duvidas: os números de homicídios têm cor. Ser jovem e negro é corre um
risco de ser assassinado igual ao cidadão de El Salvador, um dos países mais
violentos do mundo, onde a taxa de homicídio alcança 60 mortos por 100.000
habitantes.
A poucos dias as redes sociais e suas uteis ou inúteis polemicas,
foi “sacudida” com a presença de Maju Coutinho, na bancada do Jornal Nacional,
de um lado defensores do pioneirismo, mulher negra em papel de destaque na
televisão, e do outro lado, críticas algumas abertas outras veladas, contrarias
ao pioneirismo deste momento. Este episódio apenas reforça a necessidade de
termos mais mulheres e homens negros, desempenhando papel relevante,
possibilitando uma visibilidade, antes negada, onde ao negro era apenas
permitido o lugar de serviçal, as novelas são exemplos dessa “barreira” imposta
aos de cor negra, basta uma pesquisa rápida na história da televisão brasileira
para confirma essa situação.
Enfim, façamos de nossas inquietações, sempre, um diálogo
democrático.