sexta-feira, 30 de outubro de 2020

De tempos sombrios...inquietações.

 

De tempos sombrios...inquietações.

Luciano Capistrano

Professor de história: Escola Estadual Myriam Coeli

Mestrando: Profhistória/UFRN

 

Sexta-feira, 20 de novembro de 1942

Querida Kitty:

“Não posso fazer coisa nenhuma sem pensar naquela gente que partiu. Se rio despreocupadamente, me acho injusta por estar alegre. Mas vou chorar todo o dia? Não, não posso[...] Mas agora preocupa-me problemas sérios. Reconheci, por exemplo, isto, o papai, embora seja tão querido, não pode substituir todo o meu mundo de outrora.”( O Diário de Anne Frank)

             Há dias tem me inquietado essas narrativas negacionistas, do holocausto judeu à futura vacina anti-Covid, são enxurradas via as diversas plataformas digitais, muitas propagadas por líderes políticos, numa avalanche de pseudos arautos moralistas a tecer redes de tamanha insensatez que me assusta. Por trás dessa guerra de narrativas a locomotiva de uma direita desvairada aponta o dedo para inimigos imaginários. Na verdade, o objetivo, é claro, manter suas hostes acessas empunhado a bandeira do “o inimigo é o outro” e, este, deve ser eliminado.

            O ideal totalitário que deu origem ao regime nazista tão cruelmente relatado no Diário de Anne Frank, ainda teima em nos ameaçar. Ondas obscuras se alastram em todos os continentes a fortalecer criadores de “guetos”. Faço um percurso entre o relato da menina Anne e das mães de Auschwitz numa leitura ao sabor da angustia e da esperança.

 “Em novembro de 1940, todos os judeus que estavam em Varsóvia foram reunidos e levados para o gueto. Quem tentasse escapar era morto. [...] Adam Czerniaków, chefe do Judenrat, não tendo conseguido deter as ordens nazistas para deportar 6 mil pessoas por dia, preferiu suicidar-se a obedecer, ingeriu cianeto. Numa carta que deixou à esposa, ele diz: Eles estão me obrigando a matar crianças com minhas próprias mãos. Não tenho outra saída senão a morte. Não suporto mais tudo isso. Meu gesto mostrará a todos qual a coisa certa a fazer.”(Os bebês de Auschwitz – Wendy Holden)

            Uma situação real, uma história de dores vividas por milhares de pessoas, presas, torturadas, mortas em câmaras de gás, jogadas em valas comuns, por um regime erguido no seio da população embriagada por discurso de um “mito” alçado a condição de salvador da pátria, aquele escolhido para livrar o povo do “o inimigo é o outro”. Muitos acusam a crise do capitalismo, a queda da bolsa de Nova York, a crise dos anos de 1930, teria contribuído para a ascensão dos governos totalitários e enterrados caminhos democráticos.

            De tempos sombrios...inquietações... a tal pós modernidade, e, os riscos das curvas sinuosas das redes sociais ao mesmo tempo que encurtaram distancias e tempo, redesenharam o mundo da informação, dos simulacros de verdades, as tais fakes news. Bom, encerro essas minhas inquietações com um recorte de Umberto Eco: “... todos os defeitos da democracia, um regime no qual, para permitir que todos falem, é preciso deixar falarem também os insanos, e até os cafajestes.”


   Depois do pôr do sol... sempre vem um novo dia - Foto: Luciano Capistrano

domingo, 25 de outubro de 2020

25 de outubro é o dia da DEMOCRACIA

           25 de outubro é o dia da DEMOCRACIA!

Luciano Capistrano

Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli

Mestrando: Profhistória/UFRN

 

A palavra

Silenciada

Não é palavra

É calabouço.

(Luciano Capistrano)

 

      A história recente do Brasil tem as marcas do autoritarismo, do pau de arara, da tortura, dos simulacros de suicídios, da perseguição da polícia política, me refiro aos obscuros anos da ditadura civil/militar. Centenas de vidas foram ceifadas nas celas frias às margens da legalidade. Estruturas repressivas foram criadas no submundo do estado, um verdadeiro estado paralelo submergiu na escuridão que abateu sobre a democracia brasileira.

     O dia 25 de outubro é o dia da DEMOCRACIA, uma referencia ao assassinato do Jornalista Vladimir Herzog, ocorrido nas dependências do DOI-Codi do II Exército no ano de 1975. A farsa de sua morte logo foi desmascarada. A foto do fotógrafo Silvaldo Leung Vieira, na época funcionário da policia civil de São Paulo. Com a publicação da foto, caiu por terra a versão oficial de suicídio.

    Foto: Silvaldo Leung Vieira


Vladimir Herzog morto, o Exército divulgou a foto de Silvaldo Vieira com a versão de suicídio, a própria fotografia era um testemunho da falsidade contida no comunicado oficial. O impacto da morte de Herzog fez a sociedade brasileira despertar do estado de letargia vivido sobre o manto dos governos dos generais presidentes. Cresceu no meio social os movimentos por redemocratização da sociedade brasileira.

Nestes tempos confusos, onde o Presidente Jair Bolsonaro, faz elogios a um torturador, Brilhante Ustra, é necessário celebrarmos o dia da DEMOCRACIA, para reafirmarmos o papel democrático de nossa Constituição. Evocamos o discurso do Deputado Ulisses Guimarães, feito na solenidade de proclamação da Constituição de 1988: “A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras que o mataram”. Enfim, a sociedade brasileira foi Rubens Paiva, Vlademir Herzog, Zuçeika Angel, Anátalia Alves, Luiz Maranhão Filho... e não os facínoras que os mataram.

25 de outubro é o dia da DEMOCRACIA!

 

 

 

 

 

sábado, 10 de outubro de 2020

 


Do álbum de família: tempo eternizado num click.

Luciano Capistrano

Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli

Mestrando: Profhistória/UFRN



Ao folhear um álbum de família encontramos afetos, são cliques a dizerem das alegrias, das dores, das emoções vividas, e, de memórias eternizadas, muitas vezes nas páginas amareladas ou em molduras quebradas. São as fotografias expostas na sala de visitas,  no quarto de dormir, ou perdidas em um canto escuro da casa. Gosto de sentir a emoção ao olhar velhos e empoeirados álbuns. Nestes tempos modernos, o papel fotográfico, virou um “logaritmo”, transformou-se num “objeto” digital, algo solto nas nuvens. São muito os encontros nas redes sociais de fotos antigas, retiradas de antigos álbuns fotográficos, digitalizadas permanecem as memórias afetivas.

Ver essas imagens é uma rica experiência é um:

Exercício fascinante é o de resgatar os nomes, hábitos e o dia-a-dia dos moradores que habitaram determinada casa que vemos nas antigas fotos das cidades; detalhes sobre a arquitetura das edificações, o traçado das ruas, a vegetação ornamental; particularidades acerca das atividades do comércio através das placas das fachadas; os cartazes promocionais anunciando algum produto medicinal ou alguma apresentação teatral; o tipo de transporte urbano; a calma de certas ruas e o burburinho e outras, a moda, o gesto, um certo ritmo no andar, a malícia no olhar… o comum e o suspeito, o explicito e o implícito. É o espetáculo da cidade, identificável pela aparência gravada na imagem fotográfica: precioso documento, que preserva a memória histórica. Trata-se, contudo, de um espetáculo misterioso em sua trama, em seus códigos, em seus símbolos, naquilo que esconde intra-muros, nos seus segredo não revelados […] (KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. Cotia/SP: Ateliê Editorial, 2012, p.129-130).

O desvendar dos mistérios contidos nas fotos de antigos álbuns é mesmo fascinante, são memórias saídas dos “intra-muros” dos aquivos particulares ou públicos a apresentar um passado que diz das vidas privadas mas dizem da urbe, assim, andar por este mundo de “clicks” é pisar no solo pantanoso da história. 

Finalizo este curto artigo com o registro fotográfico do acervo familiar do poeta Carlos Gurgel. Na foto da esquerda para a direita seus irmãos Fernando, Gerdenia, Sérgio e Carlos, ao centro o seu pai Deífilo Gurgel, em um dia de 1963 ou 1964, nas margens da Lagoa Manoel Felipe. Ao olhar essa imagem, me chama atenção o espaço, o entorno dos personagens, retratados. Claro que a presença do grande pesquisador de nossa cultura, Professor Deífilo Gurgel, ladeado por seus filhos, nos permite também pensar no ser humano despido das vestis do intelectual. Na foto encontramos o pai e os filhos. O “parque ambiental” ou o “central park” da cidade de Natal, ainda com sua cobertura verde, deveria ser agradável brincar ao redor da lagoa embaixo das árvores. Do álbum de família: tempo eternizado num click.


Foto: Acervo Carlos Gurgel - da direita para a esquerda: Fernando, Gerdenia, Sérgio e Carlos, ao          centro o seu pai Deífilo Gurgel,

domingo, 4 de outubro de 2020

Sobre uma cidade de letras e artes… mas é sobretudo: liberdade.

Sobre uma cidade de letras e artes… mas é sobretudo: liberdade.

Luciano Capistrano

Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli

Mestrando: Profhistória/UFRN

Meu pai um leitor voraz, me conta histórias de uma Natal da época da administração do Prefeito Djalma Maranhão. Diz papai das Praças de Cultura e das Feiras de Livros, realizações de uma gestão com o olhar e ações voltadas para a disseminação das artes entre a população de Natal. Eram todos os recantos da urbe inseridos nestes projetos de cultura. Desde sempre me encantou a ocupação dos espaços públicos com estes tipos de ações, as Praças de Cultura, então, eram lugares encantados, encontros de gente com a cultura identidade do povo Potiguar.

Nestes tempos de campanha eleitoral, onde escolheremos os ocupantes do Palácio Frei Miguelinho e o ocupante do Palácio Felipe Camarão, precisamos fazer essas inquietações em voz alta, dialogadas, sobre os caminhos da urbe. A cidade que queremos tem de ser ditas nas ruas, nas esquinas, nos lugares de trabalho, nas áreas de lazer, nas praças… enfim, em nossas conversas o tema das escolhas da composição do  legislativo municipal e do chefe do executivo municipal, faz necessário. Num exercício democrático: pensar os rumos da urbe para além do período eleitoral.

Ao fazer esse caminhar nas escritas das memórias, me encontro com “Imagens do Tempo”, de Edgar Barbosa. Em sua escrita, o jornalista de Ceará-Mirim, com toda intensidade humanística de seus textos, nos permite uma viagem ao tempo das Feiras de Cultura, das Praças, dos Folguedos populares, da Galeria de Arte… das alegrias de um tempo estampado nas conversas com papai e seus amigo/clientes do Sebo Cata-Livros  da rua da Conceição. 

Edgar Barbosa nos convida ao ano de 1957, um convite a reflexão sobre o significado das Feira de Livros, patrocinadas pela Prefeitura, um convite para nos inquietarmos diante dos obscuros regimes totalitários. Sobre uma cidade de letras e artes, mas é sobretudo: liberdade. Assim:

O poder de duvidar não é menor que a faculdade de crer – e pela capacidade de um povo sentir isso é que se deve estimar seu patrimônio de liberdade. Quanto mais livros cheguem às mãos do povo – permiti-me, afinal, essa tirada à Castro Alves – mais valorizado se torna o esforço do pensamento, mais audaciosa sua vocação crítica, mais viril seu animo de encarar o perigo e sofrer a adversidade. 

[…]

Por tudo isso, esta feira inicia um capitulo inteiramente novo da história de Natal: o da popularização do livro no ambiente de rua […] imaginando as próximas Feiras de Livros de Natal, neste mesmo Grande Ponto que hoje recebe, como fortaleza do pensamento livre, sua bandeira e sua artilharia. (BARBOSA, Edgar. Imagens do tempo. Natal: Imprensa Universitária, 1966, p. 94-95).


O tempo passou, sobre aquele dezembro de 1957, da primeira Feira de Livros de Natal caiu a escuridão totalitária, e, o Prefeito das Praças de Cultura, desceu as escadarias do Palácio Felipe Camarão preso. Era um “mar de chumbo” a interromper as ações realizadas por Djalma Maranhão, assim descreveu o fatídico 2 de abril de 1964, o professor Moacir de Góes:

[…] Entre soldados do Exército, Djalma Maranhão, descia as escadarias da Prefeitura. Corri à janela e vi o meu Prefeito sendo embarcado num Jeep militar, Gravado no Jeep o selo que indicava a doação do veículo ao Exército pela “Aliança para o Progresso”. Terrivelmente simbólico e revelador”.(GÓES, Moacir de. Sem paisagem: memórias da prisão. Natal: Sebo Vermelho, 2004, p.37). 


A Natal das Feiras “livres” de Livros, pousem nas memórias da cidade banhada pelo rio Potengi, e, seja uma recordação da importância de se pensar projetos de inclusão cultural, fiquemos com a lembrança fotográfica, tão simbólica, da Galeria de Arte, erguida na Praça André de Albuquerque e  destruída tempos depois, talvez na vã intenção de apagar da memória de Natal vestígios dos tempos do Prefeito Djalma Maranhão. Lembrar é preciso!



     Fonte: Galeria de Arte - Praça André de Albuquerque - Acervo DHNET.

A esperança se vestiu de cinza.

  A esperança se vestiu de cinza.               Aqui faço um recorte de algumas leituras que de alguma forma dialogam sobre os efeitos noc...