segunda-feira, 29 de outubro de 2018

Fotografia e história: algumas reflexões

Fotografia e história: algumas reflexões
Luciano Capistrano
Professor e Historiador

“De todos os meios de expressão, a fotografia é o 
único que fixa para sempre o instante preciso e transi-
tório. Nós, fotógrafos, lidamos com coisas que estão continuamente
desaparecendo e, uma vez desaparecidas, não há mecanismo no mundo
capaz de fazê-las voltar. Não podemos revelar ou copiar a memória.”
(Henri Cartier-Bresson)

Em minhas idas e vindas aos sebos, me deparei no Sebo Vermelho com o livro de João Maurício Fernandes Miranda - arquiteto urbanista, professor da UFRN, ocupou diversos cargos públicos, em órgãos de planejamento urbano, na cidade do Natal/RN -, “Evolução urbana de Natal em 400 anos: 1599-1999”. Eu recém nomeado historiador da Secretaria do meio ambiente de Natal, “garimpava” tudo que se relacionava a história urbana, pulsava em mim, o desejo de saber dessa história da cidade, minha nova função exigia este conhecimento.
Leitura agradável, com informações importantes para compreensão dos caminhos trilhados pela cidade de Câmara Cascudo. A partir dessa obra de João Maurício, me chamou a atenção outro livro de sua autoria, “380 anos de história fotográfica da cidade de Natal: 1599/1979”, passei, então, a catar nos diversos sebos da cidade o tão desejado livro. 
Em uma tarde despretensiosa, a bela surpresa, ao acessar o site da Estante Virtual, especializado em livros usados, me deparo com um exemplar, rapidamente realizo a compra virtual, enfim, tenho o livro em minhas mãos.
Bom faço este relato com a finalidade de convidar meu caro leitor, minha cara leitora, para, neste curto artigo, fazer algumas reflexões sobre fotografia e história, motivado, por duas das minhas paixões: a fotografia e a história. Em seu livro, João Maurício, faz uma viagem sobre a Natal a partir da fotografia, nesses “380 anos  de história fotográfica”, as fotos são postas no livro, fazendo um contraponto entre “o ontem e o hoje”, são imagens da Natal do início do século XX e final da década de 1970, uma verdadeira narrativa visual da cidade. A fotografia faz parte do cotidiano presente:

O impacto cultural da fotografia sobre os últimos cento e cinquenta anos, tanto em si mesma, quanto na forma da imagem visual em movimento a que ela também deu origem, tem sido imenso, alterando completamente o ambiente visual e os meios de troca de informação de uma grande parte da população do globo. (GASKELL, Ivan. História da imagem In BURKE, Peter (Org.). A escrita da história, São Paulo, 1992, p. 241)

No fazer histórico o uso da fotografia tem ao longo do tempo ganhado espaço na produção historiográfica. A evolução tecnológica e o impulso das mídias digitais possibilitaram o acesso a diversas fontes de pesquisa com a diversidade dos tipos de documentos, são um ganho dos tempos modernos. Vejamos:

A iconografia fotográfica diz respeito a partes ou ao conjunto da documentação pública ou privada que abrange um largo espectro temático, produzida em lugares e períodos determinados. As fontes que compõem são meios de conhecimento: registros visuais que gravam microaspectos dos cenários, personagens e fatos; daí sua força documental e expressiva, elementos de fixação da memória histórica individual e coletiva. Em função de tais características, constituem documentos decisivos para a reconstituição histórica. (KOSSOY, Boris. Os tempos da fotografia: O efêmero e o perpétuo. Cotia: Ateliê Editorial, 2007, p. 34-35)

As fotografias são narrativas, sejam em “álbuns públicos ou privados, a serem interpretadas por historiadores/pesquisadores, assim, a obra de João Maurício, traz em suas páginas uma narrativa da cidade de Natal através de um rico acervo fotográfico. São imagens de uma cidade “localizada” em determinado tempo, e, podemos aferir a partir deste “380 anos  de história fotográfica”, elementos fazedores da urbe. Como, exemplo, reproduzo, abaixo, algumas fotos pinçadas do livro supra citado.
Rua da Conceição com a Praça Padre João Maria - Foto Bruno Bourgard Acervo IHGRN

Do alto da torre da Igreja Matriz ver se a Rua Santo Antônio  - Década de 1910 Foto Bruno Bourgard Acervo IHGRN

As imagens compõem narrativas silenciosas, estão a espera de intérpretes, daqueles que retiraram delas seus significados. Claro que este caminho não é uma tarefa fácil. Existe um percurso a ser vencido. O olhar do historiador, é o olhar do pesquisador, atento as partes determinantes do documento, e munido desses instrumentos, se faz o caminhar historiográfico. Recorremos, de novo, ao historiador Boris Kossoy, pioneiro nessa temática:

Contudo, a imagem fotográfica é fixa, congelada na sua condição documental. Não raro nos defrontamos com sua condição documental. Não raro nos defrontamos com imagens que a história oficial, a imprensa, ou grupos interessados se encarregaram de atribuir um determinado significado com o propósito de criarem realidades e verdades. Cabe aos historiadores e especialistas no estudo das imagens, a tarefa de desmontagem de construções ideológicas materializadas em testemunhos fotográficos. Decifrar a realidade interior das representações fotográficas, seus significados ocultos, suas tramas, realidades e ficções, as finalidades para as quais foram produzidas é a tarefa fundamental a ser empreendida. (KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica: O efêmero e o perpétuo. Cotia: Ateliê Editorial, 2012, p. 22-23)

Conjunto Gramoré - acervo DATANORTE

Ao aproximar do fim, chamo a atenção para a importância de vê a fotografia como um documento histórico, neste sentido, temos de termos diante dessa importante fonte histórica a mesma postura assumida defronte de outros tipos de documentos, devemos ao explorar os caminhos inerentes a historiografia manter os cuidados particulares do pesquisador.  Pensar a fotografia, enquanto fonte, requer a compreensão da sua trajetória, pois:

Toda fotografia tem atrás de si uma história. Olhar para uma fotografia do passado e refletir sobre a trajetória por ela percorrida é situá-la em pelo menos três estágios bem definidos que marcaram sua existência. Em primeiro lugar houve uma intenção para que ela existisse; esta pode ter partido do próprio fotógrafo que se viu motivado a registrar determinado tema do real ou de um terceiro que o incumbiu para a tarefa. Em decorrência desta intenção teve lugar o segundo estágio: o ato do registro que deu origem à materialização da fotografia. Finalmente, o terceiro estágio: os caminhos percorridos por esta fotografia, as vicissitudes por que passou, as mãos que a dedicaram, o solhos que a viram, as emoções que despertou, os porta-retratos que a emolduraram, os álbuns que a guardaram, os porões e sótãos que a enterraram, as mãos que a salvaram. Neste caso seu conteúdo se manteve, nele o tempo parou. As expressões ainda são as mesmas. Apenas o artefato, no seu todo, envelheceu. (KOSSOY, Boris. Fotografia e história. São Paulo: Editora Ática, 1989, p. 29)


Avenida Rio Branco - 1935 - acervo IHGRN

          Fotografia e história: algumas reflexões, antes de um artigo conclusivo, não tem essa pretensão, busca fazer uma reflexão sobre fotografia e história, em um contínuo pensar sobre as possibilidades dos “vestígios”  deixados em “álbuns” para a historiografia. Finalizo, então, com um pecado poético e uma fotografia, que seja um convite à reflexão.

Clicks

Clicks instantes
Registra-se
Eterniza-se momentos
Inspira-se
Exprime-se
Emoções
Em uma objetiva
Olhares capturam
O belo
O feio
Transformam-se
Em clicks de pura poesia.
(Luciano Capistrano)
Pôr do sol - Luciano Capistrano

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