sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Tortura: face cruel da Ditadura Militar/Civil

Tortura: face cruel da Ditadura Militar/Civil
Luciano Capistrano
Professor e Historiador

1964: aconteceu em abril
(Para Mailde)

Abril tempos de repensar
Falar é necessário
Democracia, liberdades em risco.
Tempos de uma legalidade interrompida
Dias sombrios
Golpe, não revolução!
21 anos de obscurantismo
Torturas
Prisões
Desaparecidos políticos!
(Luciano Capistrano)


      O estudante Augusto César Salles Galvão, 21 anos, em depoimento, cita alguns dos aparelhos utilizados nos interrogatórios dos presos políticos, feitos nas dependências dos órgãos de segurança: O pau-de-arara consiste numa barra de ferro que é atravessada entre os punhos amarrados e a dobra do joelho, sendo o “conjunto” colocado entre duas mesas, ficando o corpo do torturado pendurado a cerca de 20 ou 30 centímetros do solo. Este método quase nunca é usado isoladamente, seus “complementos” normais são eletrochoques, a palmatória e afogamento (BRASIL, 1985, p. 34)
        Estes instrumentos de tortura citados no depoimento, não foram usados nos calabouços da Idade Média, foram utilizados na história recente do Brasil. Na verdade, enquanto festejávamos a conquista do tricampeonato mundial de futebol, em 1970 no México, nos DOI/CODI e DEOPS, ouvia-se o som da tortura, corpos sendo dilacerados em unidades militares, transfiguradas de casas dos horrores. Era o início da década de 1970, quando ocorreu um endurecimento do regime sob o comando do Presidente General Garrastazu Médici.
       As Forças Armadas participaram ativamente nas ações repressivas, com seus organismos: CISA ( Centro de Informação Social da Aeronáutica ), CENIMAR (Centro de Informação da Marinha) e CIE (Centro de Informação do Exército). A cidadania, os direitos humanos, eram palavras mortas, pois: Ser preso por qualquer um desses órgãos significava, invariavelmente, a tortura e, para muitos, a morte. Os assassinatos eram encobertos com versões falsas de “atropelamento”, ou, “morte em tiroteio” que eram divulgados pelos meios de comunicação, ou, simplesmente as autoridades negavam ter feito as prisões (HABERT, 1992, p. 28) .  As prisões eram verdadeiros infernos, para alguns uma experiência enlouquecedora. Além das sevícias sofridas, os presos políticos tinham de se adaptar a ambientes insalubres. Luís Mir, em A Revolução Impossível, relata a situação dos cárceres brasileiros: Dois dos principais castigos no DOI/CODI, a cela refrigerada, com luz potente permanentemente acesa e uma temperatura que deixava os presos, nus, em estado pavoroso. No presídio Tiradentes, era a cela forte, ou cela de leão. Solitária medieval, sem banheiro, completamente escura, sem qualquer ventilação. A sensação era de ser enterrado vivo (MIR, 1994, p. 47).
     Casa dos horrores, esta deve ser a denominação mais correta para essas prisões. Poucas foram as denúncias públicas sobre o que acontecia nestas instituições prisionais. A imprensa vivia sob forte censura.
    Em 1974, com o desmantelamento das organizações de esquerda, o enfraquecimento da guerrilha urbana e os últimos momentos da guerrilha do Araguaia, o Presidente General Ernesto Geisel, assessorado por Golbery do Couto e Silva, apresenta um projeto político de volta gradual e lento da normalidade democrática. A política de distensão, lenta, gradual e segura.
       Não significou o fim da tortura, dos assassinatos, das prisões ilegais, enfim, da perseguição política. Como observou Gorender (1998, p.32): Não podia ser mantido, por conseguinte o nível de repressão policial característico do Governo Médici. Não se tratava de desmobilizar a repressão, porém de torná-la seletiva e discreta.
     Neste período, os órgãos de repressão policial fecharam o cerco sobre o PCB (partido Comunista Brasileiro). Até, então a preocupação era com as organizações da esquerda armada. Uma ostensiva operação repressiva, entre 1974 e 1975, levou dez nomes desta agremiação a fazer parte da lista dos desaparecidos políticos, entre eles, Luiz Maranhão Filho e Hiram Pereira, norte-riograndenses. 

A palavra
Silenciada
Não é palavra
É calabouço.
(Luciano Capistrano)

      A esposa de Luiz Maranhão Filho, em maio de 1974, denunciou que ele estava em São Paulo, sendo torturado pelo delegado Fleury. Até hoje seus familiares não puderam fazer um enterro digno, seu corpo continua desaparecido. E o ex sargento do exército Marival Chaves, revelou que Hiram foi interrogado no centro de tortura e execução, implantado clandestinamente pelo DOI/CODI, em Itapevi, na grande São Paulo, morreu sob tortura e o seu corpo foi lançado em um rio próximo a Avaré (MIRANDA; TIBÚRCIO, 1999, p. 324-327)
        O desmonte do aparelho repressivo, não foi um processo fácil. Na luta para o restabelecimento das garantias individuais, destacaram-se a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e ABI (Associação Brasileira de Imprensa).
       Finalizo, este curto artigo, com Ulisses Guimarães: “A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras que o mataram”. 

REFERÊNCIAS

BRASIL, nunca mais: um relato para a história. Petrópolis: Vozes, 1985

GORENDER, Jacob. Combate nas trevas. São Paulo, 1998.

HABERT, Nadine. A década de 70. São Paulo: Ática, 1992.

MIRANDA, Nilmário; TIBÚRCIO, Carlos. Dos filhos deste solo: mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura militar. São Paulo: BOITEMPO/Fundação Perseu Abramo, 1999.


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