Meu
reencontro com Myriam Coeli
Luciano
Capistrano
Professor
de História – Escola Estadual Myriam Coeli
Mestrando
– Profhistória / UFRN
Acho
que foi no dia 05 de junho de 2007, quando entrei pela primeira vez na Escola
Estadual Myriam Coeli, localizada no Conjunto Nova Natal, bairro Lagoa Azul. De
início me deparei com uma pintura na entrada da Diretoria, uma linda imagem da
patrona da escola, arte do artista, na época vice-diretor, Edson Moura.
Estampada na parede, o cartão de visita da escola, a poetisa, com seu lindo
semblante a me convidar a reencontrar sua poesia.
Foto: Luciano Capistrano - Retrato de Myriam Coeli por Edson Moura.
Professor de história e
amante das letras Potiguares, herdeiro dos hábitos de papai, foi em sua
biblioteca meu primeiro encontro com a poetisa de Vivência Sobre Vivência. Visitei
a biblioteca da escola em busca de Myriam Coeli, minha surpresa, nada
encontrei. Os livros voaram, criaram asas e voaram... Encontrei, enfim, com a Professora
de Português Lurdimar, o Inventário. Era o Projeto Chá Com Arte, sobre a
coordenação da Professora Sandra, e eu pensei em apresentar a patrona da
escola, então escolhi Busca - poesia dedicada a Celso da Silveira seu amor -, para
realizar uma Intervenção Poética:
Busca
Deus é a meta.
Eu O procuro
Em vias tortas
E em metáforas.
Sou caliça,
Fel, mordaça,
Circo e faca.
[...]
Deus é a face,
Eu, o disfarce.
[...]
Não
tem como ficar indiferente a poesia de Myriam Coeli, seus versos traduzem o ser
humano nas suas dimensões diversas. Me apaixonei. Segui os caminhos dos sebos
catando livros, no mundo dos ácaros para encontrar sua obra poética. Enfim,
numa manhã de sábado, caminhando pela Cidade Alta, ao lado dos Professores
Otoniel e Henrique, fico frente a frente de Cantiga de Amigo, livro editado em
1981 pela CLIMA, do saudoso Livreiro Carlos Lima, nem penso duas vezes, tinha
três volumes, pego todos. Versos cantam a amizade:
[...]
De minha torre mui alta
Com canções junquei estradas
Sejam albas ou serenas,
Trovares, chantos, baladas.
Meu amigo
Por quem morro.
Da torre descendo a seta,
De olhar firme no olhar.
Descerei, serei fanfarra
E viola de trovar.
Meu amigo
Por quem vivo.
[...]
Jornalista, professora, poetisa, inquieta, marcou sua passagem no plano
terreno. Mulher, esposa, mãe, deixou para nós um grande legado literário. Mesmo
não tendo o privilégio de seu convívio a conhecemos através de sua escrita. Uma
mulher a frente de seu tempo. Na década de 1950, abriu as redações dos jornais
diários para o sexo feminino, sendo inclusive a primeira mulher a ser
encontrada nas redações no período noturno.
Numa época em que Natal se expandia para além do Loteamento Reforma,
hoje bairro Felipe Camarão; o Alecrim, bairro centenário, consolidava se como
lugar de morada e comercio, nas palavras do professor Itamar de Sousa, O Cais
do Sertão; a espoliação imobiliária chegava as portas do cemitério da cidade,
como alertava nosso historiador Luis da Câmara Cascudo; a imprensa diária
publicava crônicas de Myriam Coeli para o deleite dos natalenses.
Myriam Coeli, dona de uma escrita tradutora do ser humano.
Manoel Onofre, em Literatura e Província, nos informa: “Não temos receio
de afirmar: - Myriam Coeli é um dos mais altos valores da Literatura brasileira
contemporânea. Juntamente com Zila Mamede representa, hoje, a melhor
contribuição do nosso Estado, em termos de poesia de mulher, para as letras
nacionais.” Concordo com o mestre Onofre, homem das letras que se fez
Desembargador. Myriam Coeli é sim um valioso expoente das letras potiguares.
A filha do Amazonas, Potiguar de coração, Myriam Coeli nos presenteou
com as seguintes obras: Imagem Virtual (1961); Vivência sobre vivência (1980);
Cantigas de amigo (1980); Inventário (1981) e o livro publicado pós morte, Da
boca do lixo à construção servil: o livro do povo (1992). Caro leitor, este é o
convite e a provocação, deste artigo, para não se guardar, somente, no baú da
memória, as belas letras de Myriam. A poetisa de São Jose de Mipibu, necessita
ser revivida nas escolas, nas salas de aulas, fazendo de sua palavra o caminho
das letras das novas gerações.
Uma geração que tem o direito de conhecer a Ode à Palavra: “A palavra
trabalha com hábeis mãos. Dela me sirvo à mesa com esses poucos gestos que
saciam meus segredos. Por menos que me baste, a ela servindo estou e lhe
ofereço o disfarce da ordem e da compreensão. Através dela me armo e soletro
caminhos incertos com seus ardis tão certos. Mas, animal, dela sou presa e me
resumo na proeza de lhe dar formas libertas – pois meu ofício é dar à palavra,
invenção.”
Num país sem memória, seria interessante o
desenvolvimento de projetos incentivadores de leituras potiguares. Projeto
pioneiro, que vivi como professor, na cidade de Parnamirim, “O Escritor
Potiguar Vai à Escola Pública”, meu segundo encontro com Myriam Coeli.
experiência exitosa, estudantes, professores, lendo e dialogando com escritores
norte-rio-grandense. Na Escola Municipal Manoel Ferreira, vivemos e convivemos
com Auta de Souza, Ferreira Itajubá, Zila Mamede, Myriam Coeli, Francisco Ivan,
Pablo Capistrano e tantos outros, antes, ilustres desconhecidos.
Enfim, amigo leitor, ao lembrar Myriam
Coeli descobrimos o quanto estão distantes de nossas salas de aulas os
escritores potiguares. Esperamos que a Secretaria de Cultura, a Fundação José
Augusto, a Secretaria de Educação e outros órgãos públicos e organizações da
sociedade civil, façam uma rede de promoção das letras potiguares. Acredito ser
possível reviver nos diversos municípios potiguares a experiência do projeto: O
Escritor Potiguar Vai à Escola Pública, iniciativas alvissareiras já existem, precisam
deixar de ser projetos para se transformarem em Políticas Públicas.
Assim
foi meu reencontro com Myriam Coeli e hoje guardo na minha estante, Cantigas de
Amigo, Inventário e Da Boca do Lixo á Construção Servil. Obrigado Myriam Coeli,
para além de ser patrona do meu lugar de trabalho, és poesia em nossa
trajetória de amante das letras.
👏👏👏👏
ResponderExcluirParabéns, Luciano pela escrita, reflexões e propostas. Realmente, precisamos destacar nossos autores potiguares em nossas escolas e vidas!!!
👏👏👏👏
Olá Kelly, obrigado pelo comentário e partilha, sua presença e leitura, destes meus escritos me anima a continuar!!
ExcluirA poesia de Myriam Coeli nos encanta. A UBE/RN acaba de lançar uma coletânea de Contos e Crônicas na qual homenageia 7 ícones da crônica potiguar. Dentre eles, Myriam Coeli, que teve a sua última carta escrita em vida publicada. E também uma crônica de Vicente Serejo "Myriam do Céu" publicada. Neste ano foi lançado em Natal um livro com sua obra poética, organizado pelos filhos Cristiana Coeli Goldie e Eli Araújo, pela editora Sol Negro, intitulado: Myriam Coeli: Branco e Nanquim. Agora, falta alguém editar uma coletânea com suas crônicas... Parabéns, Luciano Capistrano pelo texto.
ResponderExcluirQue bom José de Castro, fico feliz com seu comentário e as informações, um abraço fraterno. Obrigado.
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