domingo, 20 de outubro de 2019

Resolução Orçamentária de Natal de 1919: uma inquietação.


Resolução Orçamentária de Natal de 1919: uma inquietação.
Luciano Capistrano
Professor de História: Escola Estadual Myriam Coeli
Mestrando Profhistória/UFRN
           Em minhas andanças pelos sebos, dessa vez no mundo virtual, encontro um documento datado de 30 de setembro de 1919. É a Resolução Orçamentária de 30 de setembro de 1919 para vigorar no Exercício de 1920. Trata-se de um documento da Intendência do Município de Natal. Meus olhos brilharam, o coração palpitou, coisas de quem vive os caminhos de Clio. Comprei.
        Algumas curiosidades apontadas no documento orçamentário do município se referem ao vencimento do professor:
Vencimentos do Professor diurno da Cidade Alta: 1:200$000
Vencimentos do Professor noturno da Cidade Alta: 800$000
Vencimentos da Professora da Cidade Alta: 1:440$000
Vencimentos da Professora da Cidade Nova: 1:440$000
Vencimentos do Professor de Ponta Negra: 720$000
Vencimentos da Professora de Ponta Negra: 720$000
            O que me inquietou com essa tabela de vencimentos dos profissionais do magistério, foram os valores por região da cidade e por questão de gênero e do ensino diurno e noturno. A primeira leitura fria, sem outros elementos as mãos, com apenas as informações da Resolução Orçamentária, identifico uma situação de critérios diferenciados para classificar este profissional da educação.
            O caso do Professor da Cidade Alta do turno noturno, receber um vencimento inferior ao Professor da mesma Cidade Alta me faz pensar que o ensino noturno, dedicado as camadas de trabalhadores sofre ao ofertar um salário abaixo do diurno.
Do mesmo modo, acontece com regiões distintas da Natal de 1919/1920, vejamos, a situação de Ponta Negra, naquela época uma localidade rural da cidade, distante do centro. Pois bem, o vencimento do Professor ou da Professora, que assumisse uma sala de aula nessa localidade, receberia um vencimento 50% menor do que ganharia se trabalhasse, por exemplo no bairro Cidade Nova, que é hoje Tirol e Petrópolis. Cidade Nova o terceiro bairro criado em Natal, nasceu par atender a elite capitaneada pela oligarquia Maranhão.
            Essas diferencias salariais me leva a crer em uma desvalorização do ensino nas áreas periféricas da urbe. Faço aqui uma observação: este fato carece de uma pesquisa mais cuidadosa, de todo modo vale o registro, até porque existe uma lógica ao pensar na discriminação das áreas periféricas em relação as áreas centrais. Inclusive, é pertinente observar que o bairro Cidade Nova, tem um motivo a amis para se exercer o ofício do magistério naquela região da cidade. Os vencimentos dos professores chegam ao maior salário indicado para este profissional no documento. Em uma escala de valorização por bairros e região: 1º Cidade Nova e Cidade Alta, e 2º Ponta Negra, para ficarmos nestes exemplos descritos no orçamento municipal.
            Por fim, outro detalhe nos chamou a atenção, o fato dos vencimentos das Professoras, em alguns casos serem maiores do que os dos Professores, o que demonstra uma preferência para as mulheres na contratação do profissional do magistério. Deixo, então, um convite aos historiadores, para pensarem a formação social de Natal, a partir da leitura destes documentos administrativos. São fonte importantes para compreendermos a composição socioeconômica da sociedade natalense ao longo do tempo. Seja, enfim, este curto artigo,  Resolução Orçamentária de Natal de 1919: uma inquietação,  uma porta quem sabe para uma pesquisa histórica.

6 comentários:

  1. Muito interessante, há mesmo muito a interpretar da resolução, mas pelo menos não podemos dizer que a mesma era machista ou patriarcal, o que não seria absurdo ou imoral pro contexto histórico em questão.

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    1. Pois é amigo, uma leitura simples de um documento e suas provocações/reflexões. Um abraço e obrigado pela leitura e comentário

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  2. Luciano,
    Mais uma vez vc nos proporciona algo para pensar, refletir e estudar. A partir de seu texto, muitas perguntas sugem em minha mento.
    Parabéns e muito obrigada por mais um texto que nos permite visitar o passado e pensar sobre o presente.

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    1. Obrigado amiga pela leitura e comentário, a ideia é essa mesmo de provocar inquietações sobre nossa formação histórica, um abraço fraterno.

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  3. Verdadeira reliquia. Excelente fonte historica. Um estudo sobre o salario docente - desde as cartas regias (seculo XVIII) ate a Lei do Piso do Magisterio (2008) na cidade do Natal/ RN daria uma boa tese de doutorado.

    Prof. Maxuel Araujo
    Historiador

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