Antes
do pôr do sol... lembremos das vitimas de Tchernóbil.
Luciano
Capistrano
Professor
de História: Escola Estadual Myriam Coeli
Mestrando:
Profhistória/UFRN
Em
uma das aulas com a turma do 1º C, o aluno Ricardo me interpelou sobre uma série
que ele estava assistindo, "Chernobyl", eu desconhecia a série, então iniciamos
uma conversa sobre o desastre nuclear acontecido na região da Bielorrússia, em
26 de abril de 1986. Um tema instigante. Essa conversa me fez relembrar das
noticias transmitidas pelos canais de comunicação a época do desastre. Uma
tragédia distante do meu “mundo”, mas me lembro das conversas com papai sobre o
noticiário.
Morador
do Conjunto Santa Catarina, na década de 1980, minha preocupação era com o ônibus,
minha condução diária para a Livraria Independência, meu primeiro emprego. Lembro-me
de sair todos os dias pendurado na porta até o Alecrim, apesar das
recomendações de mamãe para não fazer isso. Era quase impossível pegar um ônibus
sem ter de “arriscar” a vida. Eram com emoção as viagens realizadas diariamente, entre Santa Catarina / Alecrim.
Bom
feito este parênteses, vamos ao tema deste artigo, o desastre nuclear de
Tchernóbil. Para além das cenas descritas por Ricardo e depois conferidas por
mim, na série dirigida por Craig Mazin, faço, aqui, uma inquietação em voz
alta: Antes do pôr do sol... lembremos das vitimas de Tchernóbil.
Foto: Luciano Capistrano - O Pôr do Sol!
Vi-me compelido a
pensar sobre o dia 26 de abril de 1986, noticiado pelo Jornal Nacional no dia
seguinte, quando diante da TV comentei com papai sobre o ocorrido. De fato, me
preocupei com a possibilidade da contaminação, pensei na hora: vamos todos, eu,
papai, mamãe e meus irmãos para o Capim, meu refúgio, assim pensava, claro uma
segurança imaginária que trago desde os tempos de criança da Vila Mauricio.
Provocado
então por meu aluno Ricardo, procurei ler sobre o tema, foi nessa busca que
encontrei na Livraria Leitura o livro, “Vozes de tchernóbil: a história oral do
desastre nuclear”, da jornalista Svetlana Aleksiévitch. Encontrei o livro no
dia 16/11/2019, ainda estou lendo, e, a cada página, a cada parágrafo, os olhos
marejam, as lagrimas insistem em cair. Faço essa escrita para partilhar das
minhas inquietações, não me alongarei no
texto, mas pretendo continuar em outro momento a tratar desse assunto. Por
enquanto vou pisando devagar os caminhos espinhosos abertos por Aleksiévitch:
No entanto, a cidade
ficou lotada de veículos militares, todas as estradas foram fechadas. Havia
soldados por toda parte. Os trens regionais e expressos pararam de circular. As
ruas eram lavadas com uma espécie de pó branco... Fiquei assustada: como iria,
no dia seguinte, à aldeia comprar leite fresco? Ninguém falava em radiação, só
os militares circulavam com máscaras respiratórias... As pessoas compravam os
seus pães, saquinhos com doces e pastéis nos balcões... A vida cotidiana
prosseguia. Só que... as ruas eram lavadas com uma espécie de pó... (
ALEKSIÉTCH, Svetlana. Vozes de
Tchernóbil: a história oral do desastre nuclear. São Paulo: Companhia das
Letras, 2019, p. 18-19).
Neste
relato já fica claro o caráter obscuro que envolveu toda a situação
desencadeada com a explosão do reator nuclear, me refiro a falta de clareza nas
informações, as autoridades da ex União Soviética, simplesmente esconderam o
real perigo da população das áreas atingidas pela radiação atômica. O ar, a
terra e tudo que habitava a região foram condenados a própria sorte. Os
monstros invisíveis liberados logo depois com as explosões, estavam nos lares,
nas hortas, nas ruas, por toda a parte.
As
primeiras vitimas foram os bombeiros e os funcionários da usina. Finalizo, com outro fragmento do livro citado,
encerro para continuar a leitura e convido minha cara leitora, meu caro leitor,
para continuarmos a refletirmos sobre o papel que deveria ter sido
desempenhado pelas Instituições Governamentais de Moscou nos primeiros
instantes informando as pessoas dos reais motivos de tantos militares estarem
nas ruas e o porque da evacuação, anunciada dias depois da explosão. Talvez
relato como este não existissem:
Pelo
aspecto, parecia um bebê saudável. Bracinhos, perninhas... Mas tinha cirrose.
No fígado havia 28 roentgen, e uma lesão congênita no coração. Depois de quatro
horas, me disseram que ela tinha morrido. E me falaram de novo: ‘Nós não vamos
te dar o corpo dela’. ‘Como não vão me dar o corpo?! Sou eu que não o darei a
vocês! Vocês querem tomar minha filha para a ciência, pois eu odeio a sua
ciência! Odeio! A sua ciência já levou o meu marido e agora quer mais... Não darei! Eu mesma a enterrarei. Ao lado
dele...’ [Passa a falar em sussurros.] ( ALEKSIÉTCH, Svetlana. Vozes de Tchernóbil: a história oral do desastre
nuclear. São Paulo: Companhia das Letras, 2019, p. 34).
Volto
a leitura. Façamos das nossas inquietações, sempre, um dialogo democrático.